sexta-feira, 19 de dezembro de 2008

da vida alheia...

Saiu de casa colocando seus óculos escuros e puxou se Marlboro do bolso, bem como o fósforo e pensou, enquanto acendia, no desagradável gosto que o fósforo dava ao seu cigarro preferido. Colocou seus fones de ouvido e foi andando até o metrô.
O cheiro da gente estranha lhe era incômodo, por isso evitava contato com pessoas desconhecidas - apesar de que medo era o principal motivo, mas isso ele não revelava a ninguém.
Saiu do metrô e encaminhou-se a escada que dava acesso à rua. Ao subir o primeiro degrau, lhe ocorreu a idéia de olhar para o lado. Comoveu-se. Ele, o homem forte da casa, aquele que, desde pequeno evitava emoções e sentimentos. Deparou-se com a criança mais bela que havia visto. Os oito anos que aparentava o deixaram intrigado - como uma criança tão linda podia estar ali, mendigando sentada na suja escada do metrô, rota e maltrapilha? Nada fez.
Ao sair da estação, o segundo Marlboro e novamente o pensamento sobre o fósforo. Compraria um isqueiro mais tarde, se lembrasse.
Chagando ao trabalho, pela primeira vez, reparou o decote de sua secretária. Não que ela nunca usasse decote, afinal era comum vê-la em trajes sumários, mas ele não era de notar os serviçais, como ele próprio chamava.
No horário do almoço, trabalhou, sentiu-se sem fome. As vezes, gostaria de nunca trabalhar e sua barriga protuberante revelava que poderia comer a todo momento se lhe deixassem.
Fez, as 14h04, sua sexta visita ao terraço do prédio. Sentia-se sem fôlego, mas seu cigarro pós-almoço era necessário, mesmo que não lhe houvesse almoço.
Debruçou-se sobre o parapeito. A cidade, constantemente nublada, hoje tinha a agradável presença do sol. Comentou com o fumante ao lado o quão estranho estava seu dia. Sem entender, o vizinho de cigarro ignorou e afastou-se.
Ao sair do trabalho, atravessou a rua e comprou, no comércio próxima, sua tradicional garrafa de vinho branco.
O caminhão que lhe atropelou na travessia de volta mal reparou na sua existência. Quanto aos outros motoristas, somente praguejavam pela hora que o sujeito escolhera para ser a de sua morte e pelo engarrafamento que a escolha causara.

3 comentários:

Adriana Gomes Ilarreguy disse...

Dizem que ao ler você deve conseguir imaginar o que o autor descreve em sua narrativa. Pois bem, caro Dedé, és um dos poucos que me faz imaginar.

Dedé disse...

isso me faz pensar que eu escrevo quase bem, dri

Unknown disse...

você escreve MUITO bem õ.õ
e o protagonista se parece bastante com o autor ein?haha <3